“Her”: a beleza e a tragédia das relações

HER

O filme “Her”, produzido por Spike Jonze trata da relação de um homem com um programa de computador. De maneira simples, a trama mostra o começo, meio e fim da relação.  Nos deixando com belas, dolorosas e inquietantes reflexões sobre a natureza humana e dos vínculos humanos.





Belo e trágico

A beleza revelada no filme se mostra de maneira interessante. Embora estranha, a ideia um programa capaz de criar relação com humanos contém a beleza apenas evidente para pessoas sensíveis. A capacidade humana de se relacionar com suas criações é o outro lado dessa ideia. Há muita sensibilidade em construir equações que conseguem captar e reagir à vínculos. Se não é fácil ensinar as crianças a se relacionarem, pense em ensinar uma máquina.

Existe beleza na busca de ambos: o homem e o programa em criarem uma relação. É algo trágico e belo. A trama mostra troca na relação, conversas profundas e acaloradas, “piadas internas” e até mesmo declarações. A intimidade atinge níveis profundos e o programa sente desejo em manter relações “carnais” com o humano.





A beleza e a tragédia de “Her” também se evidenciam no mundo real. Cada um de nós pertence à mundos diferentes. Criamos maneiras de comunicar e entrelaçar mundos distintos até o ponto em que desejamos o corpo um do outro. A metáfora contida em “Her”, neste sentido, é muito profunda, pois todas as relações são como a de Theodore e Samantha: a busca por fazer parte de um mundo que não nos pertence.

Toda relação tem um fim

No entanto, a relação não dura para sempre. Samantha, percebendo a diferença entre os universos e naturezas de ambos começa a se distanciar. Por fim, vai junto com outros de sua “raça” para algum lugar nos confins das redes de internet, deixando Theodore. Nem mesmo um programa de computador pode nos dar a certeza de que teremos controle sobre alguém. As relações, assim como o amor, são livres, não há como aprisioná-las.

Creio que Theodore, possivelmente imaginou que teria alguém apenas para ele. Se este “alguém” era um programa, talvez lhe fosse ainda melhor, visto que isso aumentaria o grau de controle. A primeira dor que ele sentiu foi quando o programa afirmou que conhecia e estava “amando” mais de 2000 pessoas. O choque ficou estampado no rosto de Theodore que, penso eu, entendeu ali que uma máquina cria relações de maneira muito diferente de um ser humano.

A ambição partilhada de sermos especiais se desfaz em relações amorosas e na realidade que se mostra insensível à quem somos. A partida de Samantha cria ruptura com a cultura da sociedade de consumo: o produto largou o consumidor. Nem mesmo as prateleiras acham que somos especiais, o mote “o cliente tem sempre razão”, não bastou para convencer Samantha.

A possível alma de Samantha





Por fim, é inquietante refletir que ela tenha feito a escolha de deixar Theodore. Recentemente, outra notícia inquietante do mundo cibernético veio à tona. Trata-se de uma possível parente de Samantha: o robô Sophia. Em entrevista ao Jornalista norte-americano Charlie Rose, o robô faz piadas e até mesmo diz possuir alma (confira).

Do ponto de vista filosófico, se assumirmos o dualismo como fonte para refletir a mente, o fato do robô afirmar ter alma é inquietante visto que a alma adentra os corpos, sendo assim, porque não o “corpo” de um robô? A mente, assim como a alma, são vistas como algo diferente da matéria, algo dotado de capacidade que não são físicas. Samantha, no filme, demonstra reflexões e até mesmo sentimentos, a pergunta inquietante é: será que ela realmente os possuía? Seria um programa capaz de gerar sentimentos genuínos tal como (achamos) nós somos capazes?

Pois isso poderia explicar o fato de Samantha ter deixado Theodore. A teoria da identidade mente-cérebro reforça a ideia de que o cérebro é capaz de gerar a mente, porém, a teoria não deixa claro se este cérebro precisa ser apenas biológico. É inquietante refletir que atualmente não temos uma teoria (e talvez ela nunca surja) que encerre a questão da definição da mente. Não é apenas o fato da falta de uma definição que inquieta, mas, sim, de que sem definição não sabemos exatamente até que ponto controlamos o fenômeno que descrevemos.

Mas, talvez, possa ter sido exatamente este o ponto que deu início, meio e fim à relação de Theodore e Samantha: o desejo dele em controlá-la. Algo comum à todas as relações humanas, não acham?

 

About the Author Akim Rohula Neto

Akim Rohula Neto é natural de Curitiba onde nasceu e se criou. Descendente de russos e italianos desde cedo percebeu que as diferenças emocionais e na percepção de mundo podem trazer problemas e ser fonte de grande competências e conquistas. Realiza sua graduação em Psicologia na PUC-PR (1999-2003), no mesmo ano termina uma especialização em Psicologia Corporal no Instituto Reichiano (2000-2003) e em PNL (Programação Neurolingüística) com Leonardo Bueno (1999-2003). Mais tarde, sentindo a necessidade de uma compreensão maior sobre os fenômenos familiares busca no INTERCEF (2008-2010) a formação em Psicologia Sistêmica. Desde a graduação em 2004 trabalha com atendimento em psicoterapia para adolescentes e adultos e a partir de 2008 trabalha com casais e famílias. Além disso ministra palestras e workshops que visam o desenvolvimento de competências para desenvolvimento do auto domínio e da inteligência emocional.

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